2025-04-18
IDOPRESS
O ex-presidente do Peru Ollanta Humala e Nadine Heredia — Foto: Luka GONZALES / AFP/30-04-2018
Não há,até o momento,justificativa plausível para a decisão do governo brasileiro de conceder asilo diplomático a Nadine Heredia,mulher do ex-presidente peruano Ollanta Humala. Os dois foram condenados a 15 anos de prisão no Peru por lavagem de dinheiro,ao receber US$ 3 milhões da empreiteira Odebrecht para financiar a campanha eleitoral que levou Humala à Presidência em 2011. Nadine,influente durante o governo,foi cofundadora do Partido Nacionalista. Os detalhes foram revelados em 2016,durante as investigações da Operação Lava-Jato no Brasil.
Por aqui,processos por corrupção envolvendo a Odebrecht e outras empresas que confessaram crimes têm sido questionados com sucesso na Justiça,mas não sem controvérsia ou estranhamento da opinião pública. Independentes,os peruanos não têm nada a ver com isso — os fatos que levaram à condenação do casal foram examinados por juízes autônomos,de acordo com a lei do Peru. Em nome da relação estável entre os dois países,o governo brasileiro não deveria questionar as decisões do Judiciário peruano.
Nadine Heredia: Brasil concede asilo político a ex-primeira-dama do Peru condenada em caso envolvendo Odebrecht
Em Lima,chamou a atenção a rapidez com que foram tomadas as decisões relativas ao asilo político. Nadine e seu filho chegaram à embaixada brasileira quando a sentença estava prestes a ser proferida. Em questão de horas,ela recebeu sinal verde da diplomacia brasileira. O salvo-conduto das autoridades locais não demorou,e logo os dois estavam num avião da FAB enviado especialmente para fazer o transporte ao Brasil. A deferência,além de incomum,é inexplicável do ponto de vista jurídico ou diplomático.
Em nota breve,o Itamaraty relatou a chegada de Nadine ao país na quarta-feira,em companhia de um filho menor de idade. O texto afirma que a decisão de acolher a ex-primeira-dama foi baseada na Convenção de Asilo Diplomático. Firmada no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA),ela prevê outorga de asilo a perseguidos políticos,estabelecendo,em seu artigo IV,que compete ao país hospedeiro classificar a natureza do delito ou os motivos da perseguição. Nada disso foi explicado a contento. Há uma distinção evidente entre perseguição política e uma condenação criminal.
Contexto: Ex-presidente do Peru Ollanta Humala é condenado a 15 anos de prisão por receber propina da Odebrecht
Durante o período de investigação,há sete anos,Nadine e Humala chegaram a ser presos preventivamente. Depois de nove meses na cadeia,o Tribunal Constitucional peruano atendeu ao pedido da defesa por liberdade. O julgamento se arrastou por anos,garantindo amplo direito de defesa ao casal. Mesmo condenados,os dois têm direito a recorrer. Já cumprindo pena,Humala afirma que contestará a condenação — um sinal de que a própria Justiça peruana dispõe dos mecanismos necessários para rever qualquer sentença que se revele descabida.
Convenções de asilo,como a existente entre os países das Américas,servem para proteger quem sofre perseguição política. Em regimes ditatoriais,as embaixadas são uma saída comum para quem se vê acossado por um regime autoritário. No ano passado,o líder da oposição venezuelana Edmundo González passou mais de um mês escondido na representação da Holanda em Caracas antes de conseguir refúgio na Espanha. Mas a situação no Peru é outra. A democracia por lá passou por período disfuncional,com repetidas crises e quedas de presidentes. Daí a descrever o país como regime de exceção há enorme distância.